O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pressiona as equipes econômica e de energia por medidas para baixar a conta de luz. A ideia é usar R$ 70 bilhões de um fundo setorial e tributos federais para reduzir tarifas. O movimento é feito atento à reeleição. A investida ocorre após a intervenção política na Petrobras.
Na sexta-feira (19), o presidente indicou o general Joaquim Silva e Luna para comandar a estatal em substituição ao economista liberal Roberto Castello Branco. Neste ano, o reajuste tarifário estimado pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) será de cerca de 13%. No sábado (20), Bolsonaro afirmou que vai “meter o dedo na energia elétrica, que é outro problema também”.
O presidente disse que mais mudanças ocorrerão nesta semana. A promessa foi feita um dia após ter anunciado a troca de presidência na Petrobras. “Assim como eu dizia que queriam me derrubar na pandemia pela economia fechando tudo, agora resolveram me atacar na energia”, disse Bolsonaro a apoiadores em Brasília.
Assessores do Planalto afirmam que uma das propostas para conter a alta é a destinação de R$ 20 bilhões do Orçamento do governo para a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) -fundo setorial financiado por consumidores para criar políticas públicas, como redução de tarifas, especialmente para os mais pobres.
As discussões no momento giram em torno da manobra fiscal necessária para permitir uma injeção de recursos desse porte no momento em que o governo também pretende estender o auxílio emergencial para aqueles que ainda sofrem os efeitos da pandemia do coronavírus.
Essa medida deverá ser combinada com outra já em curso na Aneel. A agência reguladora estuda como será a devolução de cerca de R$ 50 bilhões pagos a mais pelos consumidores nas contas de luz.
Esse valor foi cobrado a mais pela incidência de PIS e Cofins sobre o ICMS das tarifas de energia. Em março de 2017, o STF (Supremo Tribunal Federal) reconheceu a cobrança como indevida e determinou a devolução.
A Aneel está calculando de que forma essa devolução será feita. Recentemente, o diretor-presidente da agência, André Pepitone, afirmou que esse recurso pode promover uma redução tarifária de 27,8%.
A proposta, segundo ele, é que isso ocorra ao longo de cinco anos. Daria então uma queda de 5% ao ano. Ainda segundo interlocutores, Bolsonaro quer que essa redução seja mais acelerada nos primeiros anos, por isso cogita o reforço de R$ 20 bilhões à CDE. A pressa se deve à campanha pela reeleição. O presidente quer reverter os danos recentes à sua popularidade.
Pesquisa Datafolha no final de janeiro mostrou uma elevação de 8 pontos percentuais na reprovação ao governo, que chegou a 40% e superou novamente a aprovação (que recuou de 37% para 31%).
Essa queda se deve à má condução da política do governo para a vacinação contra a Covid-19. Diante disso, a equipe de Bolsonaro, comandada pela ala militar, estuda medidas que possam ajudar a reverter a popularidade do presidente.
A intervenção na Petrobras foi uma dessas ações. Indicado pelo ministro Paulo Guedes (Economia), Castello Branco insistia em manter a estatal livre de qualquer interferência do governo. Com isso, houve pressão para que ele renunciasse. Porém, Castello Branco não demonstrou disposição para pedir para sair.
Na quinta-feira (18), a Petrobras anunciou reajustes de 10,2% e 15,1% para gasolina -o quarto deste ano- e diesel -terceiro de 2021-, respectivamente, a partir de sexta.
No mesmo dia, Bolsonaro disse que promoveria mudanças na estatal e anunciou isenção de impostos federais sobre diesel e gás de cozinha. A ministros, mostrou insatisfação com Castello Branco, considerado “insensível” às altas.
A gota d’água para os militares, ainda segundo assessores, foi a declaração de Castello Branco de que uma possível paralisação dos caminhoneiros por causa do aumento do diesel “não era problema da Petrobras”.
Dias antes, Bolsonaro também havia se irritado com outro reajuste, feito pouco antes da eleição da Mesa Diretora do Congresso. Para ele, a medida poderia prejudicar os interesses do governo no Legislativo. Com a indicação de Luna para presidir a Petrobras, ganha força a ideia de promover amortecimentos de preços nos combustíveis. A medida usaria o caixa da companhia.
Essa foi a estratégia usada pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que tinha no comando da estatal sua “fiel escudeira”, Graça Foster.
Naquela época, a petroleira mantinha o preço da gasolina estável subsidiando com o caixa as flutuações dos preços internacionais do petróleo. Desta forma, o governo conseguiu conter a alta da inflação.
O caso foi parar na CVM (Comissão de Valores Mobiliários). À época, o conselheiro da Petrobras Mauro Rodrigues da Cunha afirmou em depoimento à autoridade que essa política causou um dano de $ 100 bilhões à companhia entre 2014 e 2015. Cunha ainda é conselheiro da estatal, indicado pelos acionistas minoritários.
Com o arranjo no setor elétrico, Bolsonaro pode repetir o que fez Dilma em 2013, quando anunciou um desconto de 18% nas tarifas residenciais e de 32% nas tarifas comerciais, contrariando a tendência de alta então revelada pelo secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann.
Dilma justificou a redução com a entrada em operação de novas linhas de transmissão, que colocariam mais energia no sistema. Com mais oferta, a lógica era a de que o preço tenderia a baixar.
Bolsonaro quer baixar a tarifa gastando mais recursos do Orçamento. Caso essa medida seja levada adiante, será mais um revés para Guedes, que vem perdendo a queda de braço com a ala militar que tenta promover uma agenda populista.
O chefe da Economia era contrário à concessão de mais uma rodada de auxílio emergencial para aqueles que ainda sofrem os efeitos da pandemia. Foi voto vencido, e o governo estuda de que forma viabilizar o benefício.
A saída de Castello Branco é outro golpe na política liberal que ajudou a eleger Bolsonaro com a promessa de redução do papel do Estado, reformas estruturantes e privatizações.
Fonte: Diário do Litoral